Por José Dirceu
Recebeu pouco destaque na semana passada uma inusitada polêmica sobre os resultados das pesquisas eleitorais para a Presidência da República. Digo inusitada porque não se esperava que tanto tempo antes do primeiro turno das eleições que um dos lados revelasse tamanha perda de isenção.
O ponto de discórdia foram os resultados destoantes que o Instituto de Pesquisas Datafolha apresentou na corrida presidencial, com o tucano José Serra à frente (36% de intenção de voto) e a ex-ministra Dilma Rousseff nove pontos percentuais atrás (27%). Os dados referem-se a um levantamento feito no final de março, mas foram praticamente repetidos em meados de abril pelo Datafolha (Serra com 38% e Dilma com 28%).
Os números dos dois levantamentos são altamente contraditórios com a tendência verificada por todos os institutos em pesquisas anteriores, inclusive pelo Datafolha, que apontara em fevereiro 32% para Serra e 28% para Dilma, resultados que consolidavam a aproximação constante e consistente de Dilma registrada desde março de 2009.
A situação foi reforçada pelo Vox Populi no final de março deste ano (Serra 34% e Dilma 31%), mas também pelo Sensus no início de abril (Serra 32,7% contra 32,3% de Dilma). Ambos traziam um cenário de empate técnico, algo esperado pelos analistas.
Diante da divergência numérica, a Folha de S.Paulo, jornal do grupo do Datafolha, adotou comportamento altamente questionável para justificar seus números destoantes: passou a jogar suspeitas sobre o trabalho realizado pelos dois institutos de pesquisa concorrentes.
Em matérias com grande espaço no jornal e em notas de colunas, o Vox Populi e o Sensus viraram alvos da Folha. O primeiro passou a ser, nas linhas do jornal, suspeito de usar uma ordem de perguntas que poderia, supostamente, direcionar as respostas dos entrevistados. O segundo passou a ser criticado por um erro no registro do contratante da pesquisa.
Mas notem que até aquele momento a metodologia do Vox Populi não havia sido alvo de questionamentos. E não poderia ser, pois os resultados eram semelhantes aos apresentados por outros institutos, fato que confirma a correção com que o Vox Populi realizou seu trabalho. Da mesma forma, é leviana a insinuação de que o Sensus comprometeu seus resultados porque errou o nome do contratante, quando o que importa é a metodologia aplicada.
Qualquer analista de pesquisa sério que observe os dados apresentados por todos os institutos do último ano ficará intrigado com os números trazidos pelo Datafolha. Simplesmente porque há uma máxima analítica que diz ser necessário olhar a trajetória dos candidatos, não o resultado em si. Ora, a trajetória clara na disputa eleitoral é de estagnação e princípio de queda de Serra e crescimento de Dilma.
Ao contrário do que tentou propalar a Folha, as suspeitas recaem sobre o Datafolha, não sobre os seus concorrentes. É lógico que existe a possibilidade de o Datafolha ter indicado uma nova tendência, ainda não captada pelos demais institutos, mas é preciso que a mesma se confirme nos próximos dois meses.
Não nos esqueçamos, contudo, que a Folha fez questão de publicar em fevereiro que, embora a margem de erro fosse de dois pontos percentuais, os 32% de Serra contra os 28% de Dilma não era uma situação de empate técnico porque a chance de ambos com 30% era estatisticamente improvável. Ou seja, recorreu a instrumento estatístico inédito para justificar a opção por não levar à manchete o empate entre os candidatos.
Lembremos também que foi a Folha que publicou, em 1998, na semana das eleições e no dia da votação, pesquisa Datafolha para o Governo de São Paulo com o ex-governador Mário Covas bem à frente da candidata do PT, Marta Suplicy. Abertas as urnas, verificou-se que Marta quase foi para o segundo turno no lugar de Covas.
Esse conjunto de fatores provocou reação do Vox Populi e do Sensus, além de reparos também por parte da Abep (Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa). Afinal, o adequado seria um debate profundo de metodologias e de resultados, não a tática de jogar suspeita sobre os concorrentes. Mas talvez o jornal soubesse que esse debate daria razão ao Vox Populi e ao Sensus.
Aos eleitores —e leitores—, vale o alerta do episódio: a campanha eleitoral será recheada de supostas controvérsias plantadas com o objetivo de evitar o real debate a ser feito no país, o das realizações no Governo e dos projetos para os próximos quatro anos. Neste 2010, há mais lobos em peles de cordeiro do que podemos imaginar.
José Dirceu, 64, é advogado e ex-ministro da Casa Civil
Recebeu pouco destaque na semana passada uma inusitada polêmica sobre os resultados das pesquisas eleitorais para a Presidência da República. Digo inusitada porque não se esperava que tanto tempo antes do primeiro turno das eleições que um dos lados revelasse tamanha perda de isenção.
O ponto de discórdia foram os resultados destoantes que o Instituto de Pesquisas Datafolha apresentou na corrida presidencial, com o tucano José Serra à frente (36% de intenção de voto) e a ex-ministra Dilma Rousseff nove pontos percentuais atrás (27%). Os dados referem-se a um levantamento feito no final de março, mas foram praticamente repetidos em meados de abril pelo Datafolha (Serra com 38% e Dilma com 28%).
Os números dos dois levantamentos são altamente contraditórios com a tendência verificada por todos os institutos em pesquisas anteriores, inclusive pelo Datafolha, que apontara em fevereiro 32% para Serra e 28% para Dilma, resultados que consolidavam a aproximação constante e consistente de Dilma registrada desde março de 2009.
A situação foi reforçada pelo Vox Populi no final de março deste ano (Serra 34% e Dilma 31%), mas também pelo Sensus no início de abril (Serra 32,7% contra 32,3% de Dilma). Ambos traziam um cenário de empate técnico, algo esperado pelos analistas.
Diante da divergência numérica, a Folha de S.Paulo, jornal do grupo do Datafolha, adotou comportamento altamente questionável para justificar seus números destoantes: passou a jogar suspeitas sobre o trabalho realizado pelos dois institutos de pesquisa concorrentes.
Em matérias com grande espaço no jornal e em notas de colunas, o Vox Populi e o Sensus viraram alvos da Folha. O primeiro passou a ser, nas linhas do jornal, suspeito de usar uma ordem de perguntas que poderia, supostamente, direcionar as respostas dos entrevistados. O segundo passou a ser criticado por um erro no registro do contratante da pesquisa.
Mas notem que até aquele momento a metodologia do Vox Populi não havia sido alvo de questionamentos. E não poderia ser, pois os resultados eram semelhantes aos apresentados por outros institutos, fato que confirma a correção com que o Vox Populi realizou seu trabalho. Da mesma forma, é leviana a insinuação de que o Sensus comprometeu seus resultados porque errou o nome do contratante, quando o que importa é a metodologia aplicada.
Qualquer analista de pesquisa sério que observe os dados apresentados por todos os institutos do último ano ficará intrigado com os números trazidos pelo Datafolha. Simplesmente porque há uma máxima analítica que diz ser necessário olhar a trajetória dos candidatos, não o resultado em si. Ora, a trajetória clara na disputa eleitoral é de estagnação e princípio de queda de Serra e crescimento de Dilma.
Ao contrário do que tentou propalar a Folha, as suspeitas recaem sobre o Datafolha, não sobre os seus concorrentes. É lógico que existe a possibilidade de o Datafolha ter indicado uma nova tendência, ainda não captada pelos demais institutos, mas é preciso que a mesma se confirme nos próximos dois meses.
Não nos esqueçamos, contudo, que a Folha fez questão de publicar em fevereiro que, embora a margem de erro fosse de dois pontos percentuais, os 32% de Serra contra os 28% de Dilma não era uma situação de empate técnico porque a chance de ambos com 30% era estatisticamente improvável. Ou seja, recorreu a instrumento estatístico inédito para justificar a opção por não levar à manchete o empate entre os candidatos.
Lembremos também que foi a Folha que publicou, em 1998, na semana das eleições e no dia da votação, pesquisa Datafolha para o Governo de São Paulo com o ex-governador Mário Covas bem à frente da candidata do PT, Marta Suplicy. Abertas as urnas, verificou-se que Marta quase foi para o segundo turno no lugar de Covas.
Esse conjunto de fatores provocou reação do Vox Populi e do Sensus, além de reparos também por parte da Abep (Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa). Afinal, o adequado seria um debate profundo de metodologias e de resultados, não a tática de jogar suspeita sobre os concorrentes. Mas talvez o jornal soubesse que esse debate daria razão ao Vox Populi e ao Sensus.
Aos eleitores —e leitores—, vale o alerta do episódio: a campanha eleitoral será recheada de supostas controvérsias plantadas com o objetivo de evitar o real debate a ser feito no país, o das realizações no Governo e dos projetos para os próximos quatro anos. Neste 2010, há mais lobos em peles de cordeiro do que podemos imaginar.
José Dirceu, 64, é advogado e ex-ministro da Casa Civil
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